Até um fiscal da Receita Federal já duvidou que a Aerobravo fosse mesmo uma indústria aeronáutica brasileira. O fisco chegou a reter uma peça importada pela companhia mineira, que é uma das dezenas de pequenas fabricantes de aviões espalhadas pelo País. “O fiscal não sabia que existem no Brasil outras fabricantes além da Embraer e desconfiou que nossa empresa existisse”, disse Hugo Silveira, sócio da fábrica junto com seus pais. “Foi constrangedor.”
O percalço para importar componentes é só um dos imensos desafios a que se submetem as pequenas fabricantes de avião. Desconhecidas do público em geral, empresas como Inpaer e Edra tentam ganhar notoriedade no setor aeronáutico. Fruto de sonhos de aviadores, muitas delas nasceram literalmente no fundo de um quintal. São projetos de engenheiros que construíram seu próprio avião, ao mesmo tempo em que mantinham outros negócios.
Hoje, para sobreviver, além de fabricar aeronaves, essas empresas dão aulas de pilotagem, revendem aviões importados e fazem até obra de arte com materiais usados na fuselagem. Mesmo aquelas que superaram os desafios técnicos de projetar um avião ainda têm uma empreitada pela frente para ganhar dinheiro com isso.
Projetos vencedores, muitas vezes, ficam só no protótipo. Viabilizar a produção industrial e cumprir as exigências de certificação do produto com órgãos reguladores exigem investimento e um plano de negócios voltado ao longo prazo que nem todos os empresários podem suportar.
“Essa indústria impõe um investimento alto, um risco alto e um payback (prazo até recuperar o investimento) alto. Ninguém entra nesse negócio só por dinheiro. É também paixão”, explica o engenheiro aeronáutico Omar Pugliesi, cofundador da Aeroálcool, fabricante de aviões instalada em Franca (SP). “Durante anos o que me motivou foi a paixão por aviação. Porque os números não justificavam o negócio”, diz Rodrigo Scoda, fundador da Edra Aeronáutica, em Ipeúna (SP).
O maior desafio para fazer o negócio vingar é financeiro, afirmaram dez pequenos empresários do setor ouvidos pelo Estado. Até conseguir dar lucro produzindo avião, as empresas têm de ter fôlego para suportar pesados investimentos nos projetos aeronáuticos.
Os tradicionais caminhos percorridos pelas empresas de diferentes setores que tentam crescer são, por exemplo, a captação de crédito e a venda de participação a investidores, como fundos de venture capital e private equity. Por ser um negócio de alto risco e muitas vezes sem garantias, os fundos de investimento não são ativos neste setor e o crédito é escasso.
A Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e o BNDES têm uma linha de crédito para a indústria aeroespacial por meio do programa Inova Aero defesa, que soma R$ 2,9 bilhões. Para se habilitar, no entanto, é necessário cumprir requisitos, como ter receita acima de R$ 16 milhões por ano. Ou seja, as pequenas não podem participar.
“Uma empresa sem faturamento e com bons projetos não consegue crédito. O dinheiro vai para quem não precisa”, reclama o empresário João Boscardin, da curitibana IPE Aeronaves. A empresa foi uma das maiores fabricantes de planadores do Brasil nos anos 80, mas desde que teve um contrato suspenso como governo não conseguiu voltar a produzir. “Gastamos R$ 12 milhões para certificar metade do projeto de um avião agrícola na Anac e o dinheiro acabou.”
O gerente do departamento de indústria aeroespacial da Finep, William Respondovesk, reconhece que o crédito não está ao alcance de todos. “Algumas empresas precisam de um sócio que corra o risco junto com elas”, diz. Segundo ele, a Finep, o BNDES e a Embraer estão estruturando juntos um fundo de participações para investir no setor aeronáutico, com capital de R$ 131 milhões.